EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. MÉDICO GINECOLOGISTA E OBSTETRA. CONSULTÓRIO PARTICULAR. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. EPI. DIREITO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. TUTELA ESPECÍFICA. TRF4. 5009030-17.2018.4.04.7009

 

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. MÉDICO GINECOLOGISTA E OBSTETRA. CONSULTÓRIO PARTICULAR. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. EPI. DIREITO CONFIGURADO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. TUTELA ESPECÍFICA. . O reconhecimento da especialidade da atividade exercida sob condições nocivas é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador (STJ, Recurso Especial Repetitivo n. 1.310.034). . Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído, calor e frio); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997; a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica; e, a partir de 01/01/2004, passou a ser necessária a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), que substituiu os formulários SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030, sendo este suficiente para a comprovação da especialidade desde que devidamente preenchido com base em laudo técnico e contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica, eximindo a parte da apresentação do laudo técnico em juízo. . É cabível o reconhecimento da especialidade do trabalho exercido sob exposição a agentes biológicos. A exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente. Entendimento da Terceira Seção deste Tribunal. . A exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua, como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes. . Não há óbice ao reconhecimento do caráter especial da atividade laboral exercida por contribuinte individual (“autônomo”), desde que efetivamente comprovado o trabalho habitual e permanente em condições perigosas ou insalubres. . A utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia em relação aos agentes nocivos biológicos. . Conforme dispõe a NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao tratar da exposição a agentes biológicos em seu Anexo XIV, são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados. Quando se trata de consultório particular, o contato direto do médico com o paciente integra as atividades rotineiras, restando analisar se, em razão da especialidade ou outras peculiaridades, tais pacientes são potencialmente portadores de doenças infecto-contagiosas ou se há a manipulação de instrumentos contaminados, a depender da realização de pequenos procedimentos in loco ou do encaminhamento do paciente para exames em laboratório. . Honorários advocatícios majorados em razão da sucumbência recursal. . Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido. (TRF4, AC 5009030-17.2018.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 21/04/2022)

 

 

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009030-17.2018.4.04.7009/PR

 

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (RÉU)

APELADO: GILMAR ALVES DO NASCIMENTO (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de procedimento comum em que é postulada a concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de tempo de serviço especial como médico.

Processado o feito, sobreveio sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor:

Ante o exposto, julgo extinto sem resolução de mérito, ante a ausência de interesse processual, o pedido de reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 01/05/2004 a 31/05/2004, 01/07/2005 a 31/07/2005, 01/09/2007 a 30/09/2007, 01/08/2013 a 31/08/2013, 01/02/2014 a 28/02/2014, 01/07/2014 a 31/07/2014, 01/03/2015 a 30/06/2015, nos termos do artigo 485, VI, do Código de Processo Civil, e julgo parcialmente procedentes os pedidos, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de, reconhecendo o direito, condenar o Instituto Nacional do Seguro Social a:

a) averbar em favor da parte autora os períodos de atividade especial de 01/02/1986 a 28/02/1987, 01/04/1987 a 31/08/1987, 01/10/1987 a 29/02/1988, 01/04/1988 a 31/05/1990, 01/07/1990 a 31/01/1991, 01/03/1991 a 31/10/1991, 01/12/1991 a 30/11/1995, 01/01/1996 a 30/04/1998, 01/06/1998 a 31/07/1998, 01/11/1998 a 31/03/1999, 01/05/1999 a 31/07/1999, 01/11/1999 a 31/01/2000, 01/04/2000 a 30/04/2000, 01/10/2000 a 31/10/2000, 01/05/2001 a 31/07/2002, 01/04/2003 a 30/04/2004, 01/06/2004 a 30/06/2005, 01/08/2005 a 31/08/2007, 01/10/2007 a 31/07/2013, 01/09/2013 a 31/01/2014, 01/03/2014 a 30/06/2014, 01/08/2014 a 28/02/2015 e 01/07/2015 a 06/12/2017.

b) conceder à parte autora o benefício de aposentadoria especial nº 185.047.921-3, com DIB em 06/12/2017 (DER);

c) pagar em favor da parte autora as prestações vencidas, a contar da DIB, acrescidas de correção monetária a partir do vencimento de cada prestação e de juros de mora, a contar da citação, nos termos da fundamentação da sentença.

DADOS PARA CUMPRIMENTO: CONCESSÃO

NB: 185.047.921-3

ESPÉCIE:

APOSENTADORIA ESPECIAL

DIB: 06/12/2017

DIP: a apurar

RMI: a apurar

Condeno a parte autora à devolução dos honorários periciais à Justiça Federal, devidamente atualizados.

Tendo em vista a sucumbência mínima do autor, condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do §3º do artigo 85 do Código de Processo Civil, observado o disposto no §4º, inciso II, deste mesmo diploma, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação desta sentença (Súmula 111 do STJ).

O INSS apela, alegando (a) a impossibilidade de enquadramento como especial do trabalho exercido na condição de contribuinte individual, médico ginecologista que atende em consultório, pois tal atividade não é equivalente àquela desempenhada em ambiente hospitalar, não existindo exposição habitual e permanente a agentes infecto-contagiosos, seja em razão da especialidade do requerente, seja em razão da divisão do trabalho entre a atividade-fim e a administração do negócio, sendo que o autor utilizava o ambiente hospitalar apenas para intervenções como partos; (b) a impossibilidade de enquadramento como especial do trabalho exercido na condição de contribuinte individual, porque esse segurado arca integralmente com os ônus econômicos da atividade, bem como com os riscos relacionados à sua saúde decorrente da atividade exercida; (c) a ausência de uso do EPI não pode ensejar o reconhecimento do labor especial, tendo em vista que se o contribuinte individual não utiliza, o faz por conta própria e risco, e que os eventuais documentos elaborados com base em informações unilaterais prestadas pelo próprio segurado não podem, por si só, conferir o direito ao reconhecimento da especialidade do labor; (d) a impossibilidade de enquadramento como especial do trabalho exercido na condição de contribuinte individual, pois não há fonte de custeio correspondente. Pede a improcedência da ação.

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL

Com relação ao reconhecimento das atividades exercidas como especiais, cumpre ressaltar que o tempo de serviço é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.

Tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, faz-se necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n° 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n° 8.213/91 (Lei de Benefícios) em sua redação original (artigos 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor/frio, casos em que sempre será necessária a mensuração dos níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes). Para o enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo – 2ª parte), n° 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo II);

b) no período de 29/04/1995 a 05/03/1997 foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997 (período em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n° 9.032/95 (art. 57 da Lei de Benefícios)), é necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico (com a ressalva dos agentes nocivos ruído e calor/frio, cuja comprovação depende de perícia). Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n° 53.831/64 (Quadro Anexo – 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n° 83.080/79 (Anexo I);

c) a partir de 06/03/1997, quando vigente o Decreto n° 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n° 1.523/96 (convertida na Lei n° 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico ou por meio de perícia técnica. Para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerado os Decretos n° 2.172/97 (Anexo IV) e n° 3.048/99.

d) a partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (artigo 148 da Instrução Normativa nº 99 do INSS, publicada no DOU de 10-12-2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime o segurado da apresentação do laudo técnico em juízo.

Saliente-se, ainda, que é admitida a conversão de tempo especial em comum após maio de 1998, consoante entendimento firmado pelo STJ, em decisão no âmbito de recurso repetitivo, (REsp n.º 1.151.363/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).

Por fim, observo que, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo – 2ª parte), nº 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e nº 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas.

Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos nº 53.831/64 (Quadro Anexo – 1ª parte), nº 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n. 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos n. 2.172/97 (Anexo IV) e n. 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto nº 4.882/03.

Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível, também, a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n° 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU de 30/06/2003).

EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL – EPI

A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729/12/1998, convertida na Lei 9.732, de 11/12/1998, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Esse entendimento, inclusive, foi adotado pelo INSS na Instrução Normativa 45/2010.

A partir de dezembro de 1998, quanto à possibilidade de desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPIs, o STF ao julgar o ARE 664.335, submetido ao regime de repercussão geral (Tema 555), Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014 e publicado em 12/02/2015, fixou duas teses:

1) “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial”; e

2) “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria”.

Ressalte-se, por fim, que para afastar o caráter especial das atividades desenvolvidas pelo segurado é necessária uma efetiva demonstração da elisão das consequências nocivas, além de prova da fiscalização do empregador sobre o uso permanente dos dispositivos protetores da saúde do obreiro durante toda a jornada de trabalho.

INTERMITÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS

A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, mas sim, que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades do trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de caráter eventual. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho. Nesse sentido vem decidindo esta Corte (EINF n.º 2007.71.00.046688-7, 3ª Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07/11/2011; EINF nº 0004963-29.2010.4.04.9999, 3ª Seção, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. 12/03/2013; EINF n° 0031711-50.2005.4.04.7000, 3ª Seção, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, 3ª Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, 3ª Seção, Relator Luís Alberto D”Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).

CONTRIBUINTE INDIVIDUAL

O simples fato de a parte autora ter exercido atividades laborativas na condição de contribuinte individual não impede o reconhecimento da especialidade postulada.

Isso porque a falta de previsão legal para o autônomo recolher um valor correspondente à aposentadoria especial não pode obstar o reconhecimento da especialidade, o que se constituiria em ato discriminatório se ele exerceu a atividade enquadrável como especial, conforme remansosa jurisprudência desta Corte. De fato, ao instituir a aposentadoria especial e a conversão de tempo especial em comum (arts. 57 e 58), a Lei de Benefícios da Previdência Social não excepcionou o contribuinte individual, apenas exigiu que o segurado trabalhasse sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física – sem instituir qualquer limitação quanto à sua categoria (empregado, trabalhador avulso ou contribuinte individual).

Cumpre registrar que o Ministério da Previdência admite a possibilidade de enquadramento da atividade especial exercida por contribuinte individual, com supedâneo no art. 257 da IN 45/2010, que dispõe:

Art. 257. A comprovação da atividade enquadrada como especial do segurado contribuinte individual para período até 28 de abril de 1995, data da publicação da Lei nº 9.032, de 1995, será feita mediante a apresentação de documentos que comprovem, ano a ano, a habitualidade e permanência na atividade exercida arrolada no Anexo II do Decreto nº 83.080, de 1979 e a partir do código 2.0.0 do Anexo III do Decreto nº 53.831, de 1964.

Parágrafo único. Não será exigido do segurado contribuinte individual para enquadramento da atividade considerada especial a apresentação do PPP.

No mesmo sentido, segue jurisprudência pacífica do STJ, no sentido de que a limitação posta no artigo 64 do Decreto n° 3.048/99 excede sua finalidade ao extrapolar os limites da Lei de Benefícios, a saber:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL AO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. POSSIBILIDADE. RESTRIÇÃO DO ART. 64 DO DECRETO N. 3.048/1999. ILEGALIDADE. CUSTEIO. ATENDIMENTO. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE. 1. Segundo a jurisprudência desta Corte, o segurado contribuinte individual faz jus ao reconhecimento de tempo de serviço prestado em condições especiais, desde que comprove o exercício das atividades prejudiciais à saúde ou à integridade física. 2. A limitação de aposentadoria especial imposta pelo art. 64 do Decreto n. 3.048/1999 somente aos segurados empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual cooperado excede sua finalidade regulamentar. 3. Comprovada a sujeição da segurada contribuinte individual ao exercício da profissão em condições especiais à saúde, não há falar em óbice à concessão de sua aposentadoria especial por ausência de custeio específico diante do recolhimento de sua contribuição de forma diferenciada (20%), nos termos do art. 21 da Lei n. 8.212/1991, e também do financiamento advindo da contribuição das empresas, previsto no art. 57, § 6º, da Lei n. 8.213/1991, em conformidade com o princípio da solidariedade, que rege a Previdência Social. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1517362/PR, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 6-4-2017, DJe 12-5-2017)

O segurado autônomo, que recolheu contribuições como contribuinte individual, tem direito à conversão de tempo de serviço de atividade especial em comum, quando comprovadamente exposto aos agentes insalubres, de forma habitual e permanente, ou decorrente de categoria considerada especial.

Nesse sentido, a Turma Nacional de Uniformização editou a Súmula 62, com o seguinte teor:

O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física”.

No mesmo sentido, é o entendimento desta Turma, a saber:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RECONHECIMENTO. AGENTES BIOLÓGICOS. MÉDICO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. AFASTAMENTO DAS ATIVIDADES NOCIVAS. A lei em vigor quando da prestação dos serviços define a configuração do tempo como especial ou comum, o qual passa a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador, como direito adquirido. Até 28.4.1995 é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995 é necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; a contar de 06.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica. Conforme entendimento firmado pela 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal, é cabível o reconhecimento da especialidade do trabalho exercido sob exposição a agentes biológicos. A exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente. Não há óbice ao reconhecimento do caráter especial da atividade laboral exercida por contribuinte individual (“autônomo”), desde que efetivamente comprovado o trabalho habitual e permanente em condições perigosas ou insalubres. É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não. Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o pagamento do benefício, nos termos da modulação de efeitos do Tema 709 do STF. Demonstrado o preenchimento dos requisitos, o segurado tem direito à concessão da aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo, respeitada eventual prescrição quinquenal. Determinada a imediata implantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do Código de Processo Civil de 2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4, AC 5039708-42.2018.4.04.7000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 26/11/2021)

Portanto, para reconhecimento da especialidade, além da prova da exposição habitual e permanente a agentes nocivos, há que se demonstrar, por meio de início de prova material, o desempenho efetivo da atividade alegada.

FONTE DE CUSTEIO

Não há óbice à concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum ao contribuinte individual por ausência de custeio específico.

É verdade que, a teor do art. 195, §5º, da Constituição Federal, nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

Entretanto, a própria lei de custeio prevê a hipótese de reconhecimento judicial do labor especial para fins previdenciários, como segue:

Art. 43 (…)

§ 4º No caso de reconhecimento judicial da prestação de serviços em condições que permitam a aposentadoria especial após 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, serão devidos os acréscimos de contribuição de que trata o § 6o do art. 57 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

E para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei nº 8.212/91:

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

(…)

§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) (Vide Lei nº 9.732, de 11.12.98)

Por sua vez, a contribuição prevista no art. 22, II, da Lei nº 8.212/91, a que se refere o dispositivo acima transcrito diz respeito àquela devida pelas empresas para o financiamento do benefício de aposentadoria especial (arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91), e daqueles benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos.

Há previsão normativa, pois, de pagamento dos acréscimos de contribuição no caso de reconhecimento judicial. A lei indica como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa e, mais especificamente a prevista no art. 22, II, da Lei de Custeio.

A disposição está totalmente em consonância com o art. 195, caput, e incisos da Constituição Federal, que dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei. Trata-se da incidência do princípio da solidariedade.

Por fim, de se registrar que, a rigor, sequer haveria, no caso, necessidade de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC nº 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE nº 220.742-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 03/03/1998; RE nº 170.574, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31/05/1994; AI nº 614.268 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20/11/2007; ADI nº 352-6, Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30/10/1997; RE nº 215.401-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 26/08/1997; AI nº 553.993, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28/09/2005), exigência essa dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.

Desta forma, o fato de o autor ser médico autônomo e, nessa condição, contribuir individualmente à Previdência Social, não impede o reconhecimento do tempo especial.

Improvido o apelo.

AGENTES BIOLÓGICOS

De acordo com a Terceira Seção deste Tribunal, é possível o reconhecimento da especialidade do labor exercido sob exposição a agentes biológicos nocivos, conforme se depreende do julgado a seguir:

EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. – Tendo o embargante logrado comprovar o exercício de atividade em contato com agentes biológicos, de 01-03-1979 a 02-03-1987, 03-04- 1987 a 16-01-1989 e 15-02-1989 a 07-05-1997, faz jus ao reconhecimento da especialidade dos períodos, com a devida conversão, o que lhe assegura o direito à concessão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço proporcional, desde a data do requerimento administrativo, efetuado em 08-05-1997. (TRF4, EIAC 1999.04.01.021460-0, 3ª S., Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ 05/10/2005)

No mesmo sentido, julgado desta Turma: AC 5005415-63.2011.4.04.7009, TRS/PR, Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, 20/08/2018.

No que concerne especificamente às atividades desenvolvidas em contato com agentes biológicos, é possível o enquadramento nos códigos 1.3.2 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 (germes infecciosos ou parasitários humanos-animais), código 1.3.4 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79 (trabalhos em que haja contato permanente com doentes ou materiais infecto-contagiantes) (atividades discriminadas entre as do código 2.1.3 do Anexo II: médicos, médicos-laboratoristas (patologistas), técnicos de laboratório, dentistas, enfermeiros), código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n. 3.048/99 (Micro-organismos e parasitas infecto-contagiosos vivos e suas toxinas).

Veja-se, nesse sentido, o respectivo item constante no anexo ao Regulamento da Previdência Social (destaquei):

MICROORGANISMOS E PARASITAS INFECTO-CONTAGIOSOS VIVOS E SUAS TOXINAS 25 ANOS

a) trabalhos em estabelecimentos de saúde em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados;

b) trabalhos com animais infectados para tratamento ou para o preparo de soro, vacinas e outros produtos;

c) trabalhos em laboratórios de autópsia, de anatomia e anátomo-histologia;

d) trabalho de exumação de corpos e manipulação de resíduos de animais deteriorados;

e) trabalhos em galerias, fossas e tanques de esgoto;

f) esvaziamento de biodigestores;

g) coleta e industrialização do lixo.

No tocante ao exercício de funções e atividades dentro de unidades hospitalares ou unidades de saúde em geral, o Anexo 14 da NR-15 da Portaria MTb 3.214/78 (Agentes Biológicos) define que são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados.

Quanto à eventual intermitência, em se tratando de agentes biológicos está pacificado nesta Corte que “a exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes (TRF4, APELREEX 5002443-07.2012.404.7100, Sexta Turma, Relator para Acórdão João Batista Pinto Silveira, julgado em 24/07/2013).

Por sua vez, a Turma Nacional de Uniformização já sinalizou que “no caso de agentes biológicos, o conceito de habitualidade e permanência é diverso daquele utilizado para outros agentes nocivos, pois o que se protege não é o tempo de exposição (causador do eventual dano), mas o risco de exposição a agentes biológicos.” (PEDILEF nº 0000026-98.2013.490.0000, Rel. Juiz Federal Paulo Ernane Moreira Barros, DOU 25/04/2014).

Ademais, é firme o entendimento no sentido de que a mera utilização de EPI não é suficiente para neutralizar a nocividade de tais agentes agressivos e afastar o cômputo diferenciado do respectivo período laboral de exposição. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. PROVA DA EFETIVA EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. UTILIZAÇÃO DE EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. (…) 9. Para fins de reconhecimento de atividade especial, em razão da exposição a agentes biológicos, não se exige comprovação do contato permanente a tais agentes nocivos, pressupondo-se o risco de contaminação, ainda que o trabalho tenha sido desempenhado com a utilização de EPI. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física (referidas no artigo 57, § 3º, da Lei n° 8.213/91) não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. 10. a 14. (…) (TRF4 5038030-56.2013.4.04.7100, 5ª T., Rel. Des. Federal Osni Cardoso Filho, 10.08.2018)

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. (…). 4. A exposição a agentes biológicos não precisa ocorrer durante toda a jornada de trabalho para caracterização da especialidade do labor, uma vez que basta o contato de forma eventual para que haja risco de contaminação. Ainda que ocorra a utilização de EPIs, eles não são capazes de elidir o risco proveniente do exercício da atividade com exposição a agentes de natureza infecto-contagiosa. 5 a 6. (…) (TRF4, AC 5005224-96.2013.4.04.7122, 6ª. T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, 06.08.2018)

Ainda, em conformidade com o IRDR (Tema nº 15 deste Tribunal Regional Federal), é dispensável a produção de prova sobre a eficácia do EPI, pois, segundo o item 3.1.5 do Manual da Aposentadoria Especial editado pelo INSS no ano de 2017, aprovado pela Resolução nº 600, de 10/08/2017, “como não há constatação de eficácia de EPI na atenuação desse agente, deve-se reconhecer o período como especial mesmo que conste tal informação.

Atividade em Consultório Médico

Quando se trata de consultório particular, o contato direto do médico com o paciente integra as atividades rotineiras, restando analisar se, em razão da especialidade ou outras peculiaridades, tais pacientes são potencialmente portadores de doenças infecto-contagiosas ou se há a manipulação de instrumentos contaminados, a depender da realização de pequenos procedimentos in loco ou do encaminhamento do paciente para exames em laboratório.

No caso, o requerente exercia a função de médico ginecologista e obstetra, em contato direto com as pacientes, realizando vários procedimentos médicos e cirúrgicos, incluindo partos, em ambiente hospitalar.

Unilateralidade das Informações

Pondero ainda que as alegações de que os documentos técnicos que atestam o exercício da atividade médica com exposição a agentes biológicos não poderiam ensejar o reconhecimento do labor especial porque as informações nele descritas teriam sido fornecidas unilateralmente pelo segurado são frágeis para reverter a conclusão. Especialmente no que concerne ao LTCAT, o que o caracteriza é justamente a sua elaboração a partir de diligências e verificações levadas a efeito por profissionais habilitados para tanto, tais como médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

TEMPO ESPECIAL NO CASO CONCRETO

Passo, então, ao exame do(s) período(s) controvertido(s) nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.

Para tanto, colaciono trecho da sentença de procedência, que bem analisou a questão, cujos fundamentos transcrevo e adoto como razões de decidir, a saber:

Períodos

01/02/1986 a 28/02/1987

01/04/1987 a 31/08/1987

01/10/1987 a 29/02/1988

01/04/1988 a 31/05/1990

01/07/1990 a 31/01/1991

01/03/1991 a 31/10/1991

01/12/1991 a 30/11/1995

01/01/1996 a 30/04/1998

01/06/1998 a 31/07/1998

01/11/1998 a 31/03/1999

01/05/1999 a 31/07/1999

01/11/1999 a 31/01/2000

01/04/2000 a 30/04/2000

01/10/2000 a 31/10/2000

01/05/2001 a 31/07/2002

01/04/2003 a 30/04/2004

01/06/2004 a 30/06/2005

01/08/2005 a 31/08/2007

01/10/2007 a 31/07/2013

01/09/2013 a 31/01/2014

01/03/2014 a 30/06/2014

01/08/2014 a 28/02/2015

01/07/2015 a 06/12/2017

Empresa

Diversos hospitais, entre eles, Associação Hospitalar Bom Jesus e Unimed Ponta Grossa

Função

Médico ginecologista obstetra – contribuinte individual

Agentes Nocivos

Enquadramento

Biológicos

Enquadramento Legal

Enquadramento: Código 2.1.3 do Decreto 53.831/1964 e no código 2.1.3 do Decreto 83.080/79

Biológicos: códigos 1.3.4 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79; 1.3.2 do Decreto nº 53.831/64; item 3.0.1, “a”, do anexo IV do Decreto 2.172/1997 e ao Decreto 3.048/1999; além do Anexo 14 da NR – 15 do MTE

Prova

• Diploma de conclusão do Curso de MEDICINA, emitido em 22/12/1983, pela UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ com o título de MÉDICO (evento 15, PROCADM1, p. 11);

• Cédula de Identidade de Médico, CRM nº 8910, com inscrição em 16/01/1984 (evento 15, PROCADM1, p. 2);

• Certificado de Residência Médica no Hospital Evangélico de Curitiba/PR, na área básica de Obstetrícia e Ginecologia, no período de 10/01/1984 a 10/01/1986 (evento 15, PROCADM1, p. 13);

• Declaração da Associação Hospitalar Bom Jesus sobre Exercício da Atividade Profissional de Médico, desde março de 1986, emitida em 26/02/2018 (evento 15, PROCADM1, p. 10);

• Declaração da Unimed Ponta Grossa, sobre Exercício da Atividade Profissional de Médico, na especialidade de Ginecologia e Obstetrícia, como cooperado com ficha de matrícula desde 11/03/1986 (evento 15, PROCADM1, p. 9);

• Alvará Municipal sob nº 38.721 de 20/10/1988 expedido pela Prefeitura Municipal de Ponta Grossa (evento 15, PROCADM1, p. 2);

• Certidão nº 054/2018, emitida em 10/04/2018 com informações complementares do Alvará nº 38.721 (evento 15, PROCADM1, p. 36).

Audiência (evento 31)

Conclusão

Em relação ao fato de a atividade ter sido desenvolvida por contribuinte individual, oportuno observar que ao consagrar o direito à aposentadoria especial, a Lei 8.213/1991 é clara ao estabelecer que será devida, uma vez cumprida a carência, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

Como é sabido, a categoria segurado contempla não apenas o empregado, mas também, entre outros, o contribuinte individual.

Não se está a instituir benefício novo sem a correspondente fonte de custeio, pois se trata de modalidade já existente e passível de ser auferida por segurado que implementar as condições exigidas pela legislação de regência.

A Seguridade Social, ademais, como dispõe a Constituição, é financiada com recursos que não provêm especificamente de contribuições sobre as remunerações, mas também e em larga medida, de toda a sociedade e de contribuições das empresas sobre outras bases imponíveis. Trata-se da aplicação do princípio da solidariedade.

Sobre o tema há diversos precedentes do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, dentre os quais a seguinte decisão:

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL DO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. ART. 57, §8º, DA LEI N. 8.213/91. (…) 3. A lei não faz distinção entre o segurado empregado e o contribuinte individual para fins de concessão de aposentadoria especial. O reconhecimento do direito não configura instituição de benefício novo, sem a correspondente fonte de custeio. Incidência, ademais, do princípio da solidariedade. 4. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. (TRF4, AC 5025755-64.2020.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 24/02/2021)

A TRU da 4ª Região entende do mesmo modo:

PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL/AUTÔNOMO. POSSIBILIDADE. UTILIZAÇÃO DE EPI. INDIFERENÇA. DIREITO À APOSENTADORIA ESPECIAL PARA SEGURADO EMPREGADO E AUTÔNOMO. QUESTÃO DA FONTE DE CUSTEIO. DIFERENCIAÇÃO INDEVIDA. PRINCÍPIO DA IGUALDADE E DA SOLIDARIEDADE. INCIDENTE DESPROVIDO. 1. A teor da Súmula 62 da TNU, ‘O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física’. 2. Reafirmação do entendimento de que ‘o segurado empresário ou autônomo, que recolheu contribuições como contribuinte individual, tem direito à conversão de tempo de serviço de atividade especial em comum, quando comprovadamente exposto aos agentes insalubres, de forma habitual e permanente, ou quando decorrente categoria considerada especial, de acordo com a legislação’, independentemente do uso de EPI. 3. A legislação não faz distinção entre segurado autônomo e segurado empregado ao reconhecer o direito à aposentadoria especial. Não é caso de estabelecimento de benefício novo, sem designação de fonte de custeio. Trata-se de aplicação do princípio da solidariedade. 3. Incidente desprovido. ( 5001432-17.2015.4.04.7203, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator VICENTE DE PAULA ATAIDE JUNIOR, juntado aos autos em 01/12/2017)

Tem-se, portanto, que o fato de ter trabalhado como profissional autônomo, e recolhido as respectivas contribuições sem o adicional para atividade especial, não impede o reconhecimento do caráter prejudicial das atividades e, por consequência, a conversão dos períodos em tempo especial.

Reconhecimento de recolhimentos como autônomo em todos os períodos, somados a todos os documentos arrolados nas provas, e das declarações das testemunhas, que puderam confirmar o trabalho praticamente desde o início dos períodos controversos, evidenciam que a autor atuou como médico ginecologista obstetra nos hospitais de Ponta Grossa.

A função dos médicos encontra previsão legal no código 2.1.3 do Decreto 53.831/1964 e no código 2.1.3 do Decreto 83.080/79, o que enseja o reconhecimento da especialidade da função até 28/04/1995, por simples enquadramento na categoria profissional.

Laudo esclareceu que o Autor no exercício de sua função realizava cirurgias do trato ginecológico e cirurgias de parto, no centro cirúrgico do hospital. As pacientes internadas para tratamento ginecológicos e as pacientes gestantes, não eram pacientes exclusivas com doenças infectocontagiosas, porém, poderia haver atendimentos às pacientes com doenças infectocontagiosas. A carga horária do Autor em ambiente hospitalar para procedimentos cirúrgicos era em média de 4,5 horas, ao dia. O hospital informou que os pacientes com diagnóstico de doença infecto contagiosas eram isolados e realizados cirurgias em sala devidamente identificados. O Autor informou que durante o exercício de suas atividades no Hospital Bom Jesus não realizou cirurgias em pacientes na sala para atendimento de pacientes em isolamento. As atividades do Autor nos períodos em que trabalhou no Hospital Bom Jesus eram desempenhadas 100% do tempo nas dependências do centro cirúrgico do hospital. O Autor não realizava atividades e operações em contato permanente com pacientes ou com material infecto contagiante, conforme especificado pela NR15 – Anexo -14. Conforme a avaliação da diligência pericial, as atividades do Autor no exercício de sua função não o expunham de modo insalubre aos agentes biológicos, como definido na NR-15 Atividades e Operações Insalubres, Anexo 14 – Agentes Biológicos.

Não obstante o laudo pericial, é preciso referir que da descrição constante do laudo nota-se que as atividades executadas pelo requerente nos períodos controvertidos, enquanto médico ginecologista obstetra, envolviam contato com pacientes e com materiais infectocontagiosos, mesmo que não permanente, pela existência do efetivo e constante risco de contaminação.

A análise da descrição das atividades desempenhas pelo autor demonstra que a exposição a agentes biológicos e o risco de contaminação, decorrente do contato com pacientes e materiais infectocontagiantes, era inerente e indissociável do desempenho de seu labor.

Mesmo porque a atuação do autor não se resumia ao Hospital Bom Jesus, tendo trabalhado em todos os hospitais da cidade.

A propósito, veja-se que laudo individual de médico ginecologista obstetra atuante no centro cirúrgico do Hospital Unimed, onde o autor também atuou, concluiu pela exposição habitual e permanente a agentes biológicos no contato com pacientes e materiais com possibilidade de contaminação (evento 111, LAUDO1, p. 17).

A TERCEIRA TURMA RECURSAL DO RS já reconheceu a exposição a agentes biológicos do médico ginecologista obstetra.

“De outra parte, quanto ao período de 30.09.1996 a 18.08.2010, em que o autor exerceu a atividade de médico junto à empresa Unimed Vale dos Sinos Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico Ltda., consoante PPP anexado autos do processo administrativo (evento 1, PROCADM8, fl. 1), o autor exerceu a atividade de médico-obstetra no bloco cirúrgico, mantendo contato com pacientes ou em procedimentos. O laudo pericial, por sua vez, concluiu que o autor, no exercício de suas atividades, esteve exposto a “Doentes ou materiais infecto-contagiantes” (evento 33).

De acordo com o entendimento da Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, também adotado por esta Turma Recursal, “para o enquadramento do tempo de serviço como especial após o início da vigência da Lei nº 9032/95, não é necessário que a exposição a agentes biológicos ocorra durante a integralidade da jornada de trabalho do segurado, bastando, nesse caso, que haja efetivo e constante risco de contaminação e de prejuízo à saúde do trabalhador, satisfazendo, assim, os conceitos de habitualidade e permanência, analisados à luz das particularidades do labor desempenhado” (IUJEF 0008728-32.2009.404.7254, Relator p/ Acórdão Ana Cristina Monteiro de Andrade Silva, DOU 16.03.2012).

Ora, de acordo com essa linha de raciocínio, “o fato de a parte autora realizar algumas tarefas que não a exponham ao contato direto com agentes biológicos durante a sua jornada de trabalho não elide o reconhecimento da especialidade do labor”, posto que “ainda que a efetiva exposição a agentes biológicos – proveniente do contato direto com pacientes potencialmente infectados e/ou utensílios por eles utilizados – pudesse não ocorrer durante todas as horas da jornada de trabalho, o fato é que o risco de contágio inerente às atividades desempenhadas – para o qual basta um único contato com o agente infeccioso – e, consequentemente, o risco permanente de prejuízo à saúde do trabalhador, por certo caracterizam a especialidade do labor, integralmente despendido em ambiente hospitalar” (IUJEF 0008728-32.2009.404.7254, Relator p/ Acórdão Ana Cristina Monteiro de Andrade Silva, DOU 16.03.2012).

Assim sendo, noutros termos, forçoso é reconhecer que o desempenho pelo segurado de algumas tarefas sem contato direto com agentes biológicos durante a jornada normal de trabalho não afasta o reconhecimento do tempo como especial, pois a especialidade do trabalho não se configura em virtude do desgaste que o agente nocivo provocaria à integridade física do profissional, mas, sim, em virtude do risco dessa exposição.

Com efeito, para fins de reconhecimento do tempo de serviço como especial, afigura-se imprescindível a configuração do risco potencial de contaminação e contágio, devendo haver comprovação de que o requerente exerceu atividade profissional que demande contato direto com pacientes acometidos por moléstias infecto-contagiosas e/ou utensílios utilizados e potencialmente contaminados por esses pacientes, ainda que esse contato não ocorra durante o desempenho de todas as tarefas profissionais, como no presente caso.

Destarte, a sentença deve ser confirmada, acrescida dos fundamentos aqui expostos ( 5011994-21.2011.4.04.7108, TERCEIRA TURMA RECURSAL DO RS, Relatora JACQUELINE MICHELS BILHALVA, julgado em 24/04/2014).

Não se desconhece o Tema nº 188 da TNU que fixou a seguinte tese: “Após 03/12/1998, para o segurado contribuinte individual, não é possível o reconhecimento de atividade especial em virtude da falta de utilização de equipamento de proteção individual (EPI) eficaz, salvo nas hipóteses de: (a) exposição ao agente físico ruído acima dos limites legais; (b) exposição a agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos, constantes do Grupo 1 da lista da LINACH; ou (c) demonstração com fundamento técnico de inexistência, no caso concreto, de EPI apto a elidir a nocividade da exposição ao agente agressivo a que se submeteu o segurado”.

Bem se vê que a tese não excepcionou a exposição a agentes biológicos.

Com relação ao uso de EPI, necessário observar que apenas a partir de 03/12/1998, data da publicação da MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98, a utilização do equipamento de proteção que efetivamente elimine a nocividade afasta a especialidade da atividade.

Logo, o uso do EPI só deve ser analisado para os períodos posteriores a 03/12/1998, de modo que o fato de ter sido fornecido EPI antes de referida data não é suficiente para afastar a especialidade da atividade.

No laudo pericial complementar o perito esclareceu que “conforme declarações do Autor e do hospital eram fornecidos e utilizados os seguintes Equipamentos de Proteção Individual – E.P.I.’s: avental, touca de segurança, máscara de segurança, luvas de segurança e óculos de segurança, durante todo o período laboral do Autor”, e que a utilização dos referidos E.P.I.’s elidiam eventual potencial contato e contágio com os eventuais agentes biológicos insalubres.

Ocorre que ainda que utilizasse EPIs o requerente enfrentava risco acentuado de contrair doenças infectocontagiosas a partir de acidentes que acarretassem a perfuração de luvas, por exemplo, ou mesmo com a aspiração dos micro-organismos que permeiam o ambiente. Simples informação de fornecimento de equipamento de proteção individual não seria suficiente para afastar toda e qualquer possibilidade de prejuízo à saúde, pois o risco de contaminação permanece.

Ademais, em se tratando de exposição a agentes biológicos, é presumida a ineficácia dos EPIs, razão pela qual eventual utilização de equipamentos de proteção não afasta o reconhecimento do caráter prejudicial da atividade, como inclusive observou o TRF4 do julgamento do IRDR 15, citado na fundamentação.

Veja-se, a propósito, que o Manual de Aposentadoria Especial aprovado através da Resolução INSS/PRES nº 600, de 14/08/2017, refere expressamente que não há constatação de eficácia na atenuação dos agentes biológicos (3.1.5).

Por tudo isso, para o segurado contribuinte individual, é possível o reconhecimento de atividade especial em virtude da falta de utilização de equipamento de proteção individual (EPI) eficaz, também na exposição a agentes biológicos, a despeito da falta de previsão na tese fixada.

Nesse sentido os seguintes julgados:

“Refiro também que, a despeito da afetação do Tema 188 (Processo 5000075- 62.2017.4.04.7128) como Representativo de Controvérsia, admitido para “Saber se o segurado contribuinte individual pode obter o reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários após 11/12/1998, mesmo na hipótese em que a exposição a agentes nocivos à sua saúde ou à integridade física decorreu da não utilização deliberada de EPI eficaz”, no caso de exposição a agentes biológicos na atividade de médico, o uso de equipamentos de proteção individual não elide o risco de contaminação, notadamente em razão do uso de materiais perfurocortantes, o que implica o risco permanente de acidentes mesmo que observadas as normas de segurança e higiene do trabalho” 5013088-60.2018.4.04.7107, TERCEIRA TURMA RECURSAL DO RS, Relatora SUSANA SBROGIO GALIA, julgado em 12/12/2018)

Esse específico para médico ginecologista obstetra:

Destaco que, quanto à possibilidade de reconhecimento de labor especial, com efeito, aplica-se ao caso o verbete da Súmula nº 62 da Turma Nacional de Uniformização – TNU, in verbis‘O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física’.

Este colegiado, igualmente, já decidiu que a condição de autônomo não afasta, por si só, a possibilidade de reconhecimento do exercício de atividade em condições especiais. Para tanto, faz-se necessário que as provas produzidas nos autos autorizem a conclusão de que a atividade exercida preenche os requisitos exigidos pela lei vigente à época do labor. Precedentes: 5002618-83.2012.404.7202 e 5001468-34.2012.404.7213, ambos de relatoria do Juiz Federal Rodrigo Koehler Ribeiro, sessão de setembro/13).

No caso, o PPP (evento 13, PROCADM1, pp. 67/69) e o laudo pericial (evento 1, LAUDO7) indicam exposição permanente do “médico ginecologista e obstetra” ao risco biológico decorrente do “contato com pacientes passíveis ou não de portarem doenças infecto-contagiosas, objetos de uso desses pacientes, não previamente esterilizados, ou com material infectocontagiante“.

Por fim, ainda que tenha aderido ao entendimento de que é da responsabilidade do segurado contribuinte individual o uso do equipamento de proteção individual (Tema 188 da TNU), entendo que este não se aplica ao caso concreto.

Isso porque o uso de EPI eficaz não afasta o reconhecimento da especialidade pelo contato com o agente biológico, porquanto esta Turma tem reiteradamente decidido que “o EPI não pode descaracterizar a especialidade por exposição a agentes biológicos” (5000154-89.2012.404.7201, Relator Rodrigo Koehler Ribeiro, julgado em 13/11/2013).

Diante disso, a sentença merece ser confirmada para manter o reconhecimento especial do período em análise (5001133-41.2018.4.04.7201, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DE SC, Relatora LUÍSA HICKEL GAMBA, julgado em 17/08/2020)

Veja-se que os laudo individual de médico ginecologista obstetra atuante no centro cirúrgico do Hospital Unimed, mesmo com o registro do EPI, caracteriza a atividade como insalubre pela presença do risco biológico.

Assim, de todo modo, para esse laudo, foi demonstrado que inexistiu EPI apto a elidir a nocividade da exposição, de forma que a autora se enquadra na exceção prevista no item c do Tema 188 da TNU. Para a conclusão do laudo pericial, permanece a solução pela falta de eficácia do EPI na atenuação dos agentes biológicos

Possível concluir, portanto, que a parte autora trabalhou em condições prejudiciais à saúde, por enquadramento em categoria profissional, nos períodos de 01/02/1986 a 28/02/1987, 01/04/1987 a 31/08/1987, 01/10/1987 a 29/02/1988, 01/04/1988 a 31/05/1990, 01/07/1990 a 31/01/1991, 01/03/1991 a 31/10/1991 e 01/12/1991 a 28/04/1995, e em razão da exposição a fatores de risco de ordem biológica, nos períodos de 01/02/1986 a 28/02/1987, 01/04/1987 a 31/08/1987, 01/10/1987 a 29/02/1988, 01/04/1988 a 31/05/1990, 01/07/1990 a 31/01/1991, 01/03/1991 a 31/10/1991, 01/12/1991 a 30/11/1995, 01/01/1996 a 30/04/1998, 01/06/1998 a 31/07/1998, 01/11/1998 a 31/03/1999, 01/05/1999 a 31/07/1999, 01/11/1999 a 31/01/2000, 01/04/2000 a 30/04/2000, 01/10/2000 a 31/10/2000, 01/05/2001 a 31/07/2002, 01/04/2003 a 30/04/2004, 01/06/2004 a 30/06/2005, 01/08/2005 a 31/08/2007, 01/10/2007 a 31/07/2013, 01/09/2013 a 31/01/2014, 01/03/2014 a 30/06/2014, 01/08/2014 a 28/02/2015 e 01/07/2015 a 06/12/2017.

Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial, após bem analisadas as atividades laborais desenvolvidas pelo autor na função de Médico Ginecologista e Obstetra, em consultório médico particular, bem como realizando vários procedimentos médicos e cirúrgicos inerentes à área de ginecologia e obstetrícia em ambiente hospitalar, conforme comprovado em laudos técnicos e corroborado com prova testemunhal, restou evidenciado que era ínsita ao labor a exposição habitual e permanente a microorganismos infecciosos, tais como bactérias, vírus e fungos. Tal circunstância afigura-se suficiente para caracterizar risco à saúde do trabalhador.

Destarte, durante os períodos laborais controvertidos, a parte autora estava exposta a agentes biológicos potencialmente nocivos, o que dá suporte fático ao enquadramento do trabalho como especial, agentes esses que não são neutralizados pela utilização de equipamentos de proteção individual e em relação aos quais nem mesmo a eventual intermitência da exposição descaracteriza o risco de contágio.

Portanto, restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos controvertidos, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, a agentes biológicos.

Conclusão: deve ser mantida a sentença, para reconhecer a especialidade nos períodos controvertidos.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A partir da jurisprudência do STJ (em especial do AgInt nos EREsp 1539725/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, julgado em 09/08/2017, DJe 19/10/2017), para que haja a majoração dos honorários em decorrência da sucumbência recursal, é preciso o preenchimento dos seguintes requisitos simultaneamente: (a) sentença publicada a partir de 18/03/2016 (após a vigência do CPC/2015); (b) recurso não conhecido integralmente ou improvido; (c) existência de condenação da parte recorrente no primeiro grau; e (d) não ter ocorrido a prévia fixação dos honorários advocatícios nos limites máximos previstos nos §§2º e 3º do artigo 85 do CPC (impossibilidade de extrapolação). Acrescente-se a isso que a majoração independe da apresentação de contrarrazões.

Na espécie, diante do não acolhimento do apelo, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios de 10% sobre a base de cálculo fixada na sentença para 15% sobre a mesma base de cálculo, com base no artigo 85, §11, do CPC.

TUTELA ESPECÍFICA

Com base no artigo 497 do CPC e na jurisprudência consolidada da Terceira Seção desta Corte (QO-AC 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper), determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido ou revisado, a ser efetivada em 45 dias, a contar da publicação do presente julgado, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.

Na hipótese de a parte autora já estar em gozo de benefício previdenciário, o INSS deverá implantar o benefício concedido ou revisado judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

PREQUESTIONAMENTO

Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.

CONCLUSÃO

Apelo do INSS: improvido.

De ofício: determinar a implantação do benefício concedido.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e determinar, de ofício, a implantação do benefício concedido, nos termos da fundamentação.


Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003052386v12 e do código CRC 7ad393ea.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 21/4/2022, às 12:11:58


 

5009030-17.2018.4.04.7009
40003052386.V12

Conferência de autenticidade emitida em 29/04/2022 04:01:12.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009030-17.2018.4.04.7009/PR

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (RÉU)

APELADO: GILMAR ALVES DO NASCIMENTO (AUTOR)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. concessão. aposentadoria especial. tempo especial. agentes biológicos. médico ginecologista e obstetra. consultório particular. contribuinte individual. epi. direito configurado. sucumbência recursal. tutela específica.

. O reconhecimento da especialidade da atividade exercida sob condições nocivas é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador (STJ, Recurso Especial Repetitivo n. 1.310.034).

. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído, calor e frio); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997; a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica; e, a partir de 01/01/2004, passou a ser necessária a apresentação do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), que substituiu os formulários SB-40, DSS 8030 e DIRBEN 8030, sendo este suficiente para a comprovação da especialidade desde que devidamente preenchido com base em laudo técnico e contendo a indicação dos responsáveis técnicos legalmente habilitados, por período, pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica, eximindo a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.

. É cabível o reconhecimento da especialidade do trabalho exercido sob exposição a agentes biológicos. A exposição a agentes biológicos não precisa ser permanente para caracterizar a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente. Entendimento da Terceira Seção deste Tribunal.

. A exposição de forma intermitente aos agentes biológicos não descaracteriza o risco de contágio, uma vez que o perigo existe tanto para aquele que está exposto de forma contínua, como para aquele que, durante a jornada, ainda que não de forma permanente, tem contato com tais agentes.

. Não há óbice ao reconhecimento do caráter especial da atividade laboral exercida por contribuinte individual (“autônomo”), desde que efetivamente comprovado o trabalho habitual e permanente em condições perigosas ou insalubres.

. A utilização de EPI não afasta a especialidade do labor, pois é presumida a sua ineficácia em relação aos agentes nocivos biológicos.

. Conforme dispõe a NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego, ao tratar da exposição a agentes biológicos em seu Anexo XIV, são insalubres as atividades desempenhadas em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana, quando houver contato direto com pacientes ou objetos por estes utilizados. Quando se trata de consultório particular, o contato direto do médico com o paciente integra as atividades rotineiras, restando analisar se, em razão da especialidade ou outras peculiaridades, tais pacientes são potencialmente portadores de doenças infecto-contagiosas ou se há a manipulação de instrumentos contaminados, a depender da realização de pequenos procedimentos in loco ou do encaminhamento do paciente para exames em laboratório.

. Honorários advocatícios majorados em razão da sucumbência recursal.

. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício concedido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e determinar, de ofício, a implantação do benefício concedido, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 19 de abril de 2022.


Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003052387v4 e do código CRC e1d1d52b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 21/4/2022, às 12:11:58


 

5009030-17.2018.4.04.7009
40003052387 .V4

Conferência de autenticidade emitida em 29/04/2022 04:01:12.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/04/2022 A 19/04/2022

APELAÇÃO CÍVEL Nº 5009030-17.2018.4.04.7009/PR

 

RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (RÉU)

APELADO: GILMAR ALVES DO NASCIMENTO (AUTOR)

ADVOGADO: ALESSANDRA DE PAULA QUADROS SUTIL DE OLIVEIRA (OAB PR032617)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/04/2022, às 00:00, a 19/04/2022, às 16:00, na sequência 370, disponibilizada no DE de 29/03/2022.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR, DE OFÍCIO, A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

SUZANA ROESSING

Secretária

Conferência de autenticidade emitida em 29/04/2022 04:01:12.

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